O número de cidades da Amazônia Legal com facções criminosas cresceu 46% em 2024, enquanto Amazonas e Rondônia lideram as taxas de homicídios de mulheres. O envolvimento feminino no narcotráfico e a impunidade dos crimes contra mulheres são temas abordados neste texto.
Escrevo sobre violência há mais de 30 anos e, mesmo estando familiarizada com o tema, me surpreendi com as proporções que esse fenômeno tomou recentemente, em especial com relação à violência de gênero. O número de cidades da Amazônia Legal com a presença de facções criminosas cresceu 46% entre 2023 e 2024, segundo o estudo Cartografias da violência na Amazônia, lançado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública no final do ano passado, em parceria com o Instituto Mãe Crioula (IMC).
Já em relação ao homicídios de mulheres, Amazonas e Rondônia têm hoje as piores taxas: 6,4 e 6,1 mortes por 100 mil mulheres, quase o dobro da taxa média brasileira, que é de 3,8, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024. Dados que, infelizmente, acabam, na prática, se cruzando. “Boa parte dessa desproporcionalidade nas taxas de homicídio na região Norte tem a ver com a crescente participação de mulheres em atividades ilícitas”, diz Jesem Orellana, doutor em Epidemiologia e chefe do Laboratório de Modelagem em Estatística, Geoprocessamento e Epidemiologia (Legepi) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Amazônia. MULHERES NO NARCOTRÁFICO Tido como um espaço masculino por excelência, o narcotráfico passa a contar cada vez mais com mulheres em diferentes ocupações. Protagonismo que já vem sendo retratado na ficção em filmes e minisséries como Vida Bandida, estrelada por Juliana Paes, no Disney+. Os impactos do novo fenômeno têm sido sentidos na prática, na vida real. “A ampliação da presença de facções criminosas na região da Amazônia brasileira parece ter complexificado o fenômeno da violência de gênero”, aponta o relatório Cartografias da violência na Amazônia. De acordo com o estudo, diferentes pesquisas também têm demonstrado o papel que o crime organizado desempenha na “regulação” de conflitos em comunidades nas quais exerce o domínio. Suas intervenções vão de casos de violência doméstica a punições para mulheres que se relacionam com homens de comunidades dominadas por grupos rivais ou que ‘ousam’ romper o relacionamento com um homem faccionado. As penalidades variam de raspar a cabeça até a morte. A violência, em geral, é centrada nos aspectos associados ao feminino e marcada pelo ódio às mulheres: suas partes íntimas são atacadas, o rosto é desfigurado, as sobrancelhas raspadas. Orellana chama a atenção ainda para o fenômeno da interiorização dessa violência. “Ela migrou para o interior do Brasil, especialmente nas regiões de fronteira”, diz o epidemiologista.NÚMEROS DE FEMINICÍDIO SÃO SUBESTIMADOS Em relação aos feminicídios, o especialista diz que apesar de ter aumentado a capacidade do SUS, das Defensorias, do Ministério Público e do Judiciário de registrar e notificar essas violências, os números reportados estão defasados. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024, em 2023, 1.467 mulheres foram vítimas de feminicídio no país, o maior número já registrado desde que a lei foi criada. Para Orellana, no entanto, esse número pode ser muito maior. Responsável pelo chamado Vigifeminicídio, um projeto de monitoramento epidemiológico dos feminicídios em Manaus (AM), Rio Branco (AC), Porto Velho (RO) e Rio de Janeiro (RJ), o especialista diz, com base nos dados já consolidados, que só em Manaus foram registrados 498 assassinatos de mulheres, entre janeiro de 2016 e dezembro de 2022, 40,8% deles (203) foram casos de feminicídio. Entre as vítimas de feminicídio, 28% tinham envolvimento ativo com o tráfico de entorpecentes, enquanto entre as demais vítimas esse percentual foi de 67%. Inovador, o projeto reúne um conjunto de informações dispersas em diversas fontes, como institutos de medicina legal, secretarias de segurança pública, Judiciário, sistema de informação de mortalidade e imprensa, com mecanismo de captura de dados altamente sensível e baseado em inteligência artificial (FemiBot). O banco de dados tem, ao todo, 83 variáveis, do perfil da vítima até a circunstância da vitimização, tipo de arma utilizada pelo agressor e local da ocorrência, permitindo um extenso detalhamento. Para garantir a tipificação correta do crime, a classificação é feita de forma independente por dois advogados criminalistas. Em geral, o perfil das mulheres mortas de forma violenta permanece relativamente estável ao longo do tempo. A maioria (66,9%) é negra, com idade entre 18 e 44 anos (69,1%), segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024. Dados do Vigifeminicídio, em Manaus, apontam para um perfil semelhante das vítimas. A maioria é parda e tem, em média, 28 anos. IMPUNIDADE AINDA É GRANDE O que chama a atenção nas estatísticas, especialmente as de feminicídio, é a impunidade. Para se ter uma ideia da gravidade do problema, Orellana destaca que no estado do Amazonas todo o número de condenações no período de 2016 a 2022 não passa de 100, um número que não chega à metade do total de feminicídio
VIOLÊNCIA DE GÊNERO AMAZÔNIA CRIMES TRÁFICO DE DROGAS FEMINICÍDIO IMPUNIDADE
Brasil Últimas Notícias, Brasil Manchetes
Similar News:Você também pode ler notícias semelhantes a esta que coletamos de outras fontes de notícias.
Juana Rivas denuncia violencia de género vicaria por parte de su exparejaJuana Rivas ha presentado una denuncia contra su expareja, Francesco Arcuri, por violencia de género vicaria ejercida desde 2017. La denuncia detalla situaciones de violencia física y psíquica contra sus dos hijos, Gabriel y Daniel. El caso se considera pionero en España por ser violencia de género vicaria de ámbito internacional, afectando a España e Italia.
Consulte Mais informação »
Comércio Marítimo Brasileiro Crescente, Mas Balança Comercial Recui em 2024O levantamento da Associação de Terminais Portuários Privados (ATP) indica que o comércio marítimo brasileiro atingiu US$ 492,5 bilhões em 2024, com um crescimento de 2,24% em relação a 2023. Apesar do aumento no volume, a balança comercial brasileira via marítima recuou 12,9% no mesmo período. Os portos brasileiros, responsáveis por 97,2% do volume total de exportações e importações, consolidaram sua posição como motores do comércio exterior.
Consulte Mais informação »
Incêndios em Los Angeles Mostram o Impacto Crescente das Mudanças ClimáticasIncêndios florestais devastadores em Los Angeles são atribuídos a condições climáticas extremas, sinalizando o risco crescente de incêndios florestais no devido ao aquecimento global.
Consulte Mais informação »
Descontentamento com o Governo Lula CrescenteFontes do Palácio do Planalto apontam para a disseminação de fake news sobre o Pix e a alta nos preços dos alimentos como principais fatores para a queda na aprovação do presidente Lula. Senadores da base do governo reconhecem a necessidade de melhor comunicação com os segmentos da sociedade. Entre outros destaques, o Senado dos EUA aprova a indicação de Scott Bessent para o Tesouro e o Itamaraty convoca o encarregado de negócios dos EUA para uma conversa após denúncias de maus-tratos a brasileiros.
Consulte Mais informação »
Shoigu alerta para risco crescente de conflito nuclearO secretário do Conselho de Segurança da Rússia, Sergei Shoigu, alertou que o risco de um conflito armado entre potências nucleares está crescendo, citando a crescente rivalidade geopolítica e as atividades da OTAN perto da Rússia e da Belarus.
Consulte Mais informação »
Xenofobia nos EUA: Insultos a Trabalhadores Latinos Revelam Discriminação CrescenteUm vídeo viral mostra uma americana insultando trabalhadores latinos por falarem espanhol, evidenciando a crescente xenofobia nos Estados Unidos. O caso é apenas um dos muitos que circulam nas redes sociais, mostrando a discriminação crescente contra a comunidade hispânica.
Consulte Mais informação »